sexta-feira, 10 de maio de 2013

Canto Do Bêbado

         autor: Da Costa e Silva
Julgo a Vida uma taça,
 porque a vida Tenho passado bêbado, sonhando:
 Bêbado, sinto o coração cantando
 E a alma de estranha embriaguez vencida.
Ébrio do sonho, sonhador eterno,
 Nos meus sonhos de bêbado diviso
 O amor a conduzir-me ao Paraíso,
 Ao mesmo tempo que me leva ao Inferno.
Ai! Eu tenho esvaziado a Grande Taça,
 Numa sede de ardência e de frescura,
 Desde o néctar bendito da ventura
 Ao tóxico travoso da desgraça.
Foi-me a primeira lágrima vertida
 A origem da ternura – quinta-essência
 Dos sorrisos e beijos da inocência,
 Vindos do amor de minha mãe querida.
E esse filtro divino era tão doce,
 Possuía uma tal suavidade,
 Que a própria essência da Felicidade
 Eu julguei muitas vezes que ele fosse.
Depois das ilusões na quadra flórea,
 Bebi um vinho cálido e esquisito,
 Talvez o licor mágico da Glória,
 Feito das uvas claras do Infinito.
Nas nevroses do gozo, por que ama
E o faz na mesma chama consumido
Foi o vinho do Amor, vinho sorvido
 Vinho que torna o coração em chama
Vinho de sons, de aromas, de esplendores,
 Vinho da vinha de ouro das estrelas,
 Ele chegou-me muitas vezes pelas
 Estradas duvidosas dos amores...
A ponto de me encher os olhos d’água
Sorvi também o trágico falerno
 Da saudade, da dúvida e da mágoa,
 Que me arrastou ao desengano eterno,
Na angústia enorme do pesar que sinto
Libei mais tarde o tenebroso absinto
 - O veneno letífero e do tédio,
 Para o qual não encontro um só remédio,
Já eu tenho a minha alma combalida,
 Mártir da dor e vítima do mundo,
 E muito hei padecido, antes que ao fundo
 Chegue da taça trágica da Vida.
Embora! Vou lutar de encontro à sorte,
 Antes que o sonho esta ventura finde,
 Até erguer o derradeiro brinde
 No festim eucarístico da Morte!
 Bêbado eu vivo de ilusões formosas
 E temo, certas vezes, que endoudeça
 Minha triste e feíssima cabeça,
 Coroada de estrelas e de rosas.
O mais feliz dos bêbados do Sonho
Ébrio eterno por isso me suponho,
Alucinado todos os sentidos,
 O mais feliz vencido dos Vencidos,
Porque a Vida é uma taça
Tenho passado bêbado, sonhando
Bêbado, sinto o coração vibrando
 E a alma na eterna embriaguez perdida
       obra: Sangue

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